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IN.SO.LEN.TE

Nem todos queremos saber

A seleção perdeu o jogo contra a Bélgica e foi eliminada do Euro 2020, uma informação dramática para a maioria da população. No meu caso, é-me complemente indiferente, já que não tenho qualquer interesse por nenhum tipo de evento desportivo. Sim, é verdade, admito ser esse extraterrestre e dou o peito às balas: não me interessa mesmo. A nível pessoal até terei menos sobressaltos de agora em diante, pelo que até acaba por me agradar. 

Apesar disso e mesmo que quisesse, é-me impossível ficar imune ao assunto. A importância mediática que é dada ao futebol em Portugal é perturbadora e invade completamente as rotinas até de quem - como eu - não quer saber.

Nós últimos dias vi notíciários a abrir com o campeonato europeu, segmentos especiais a mostrar o hotel onde fica hospedada a seleção, diretos feitos a partir dos aeroportos de partida e chegada dos jogadores e até programas de debate público dedicados a saber qual a opinião da população sobre os resultados dos jogos. Será que isto faz sentido? É mesmo relevante fazer da vida da seleção nacional o Big Brother desportivo?

O futebol é de tal forma o ópio do povo que o pensamento crítico parece perder-se. Confunde-se fanatismo com patriotismo e julga-se a cidadania com base na mobilização "nacional".

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 Os campeonatos são negócios que envolvem milhões, mas ainda assim temos responsáveis políticos a dar a cara por este tipo de eventos. Sabendo eles que o "Zé Povinho" vira acéfalo durante as competições, os responsáveis políticos aproveitam demagogicamente a deixa para cair nas boas graças e dizer as maiores barbaridades. Não sei bem se é uma tentativa ingénua de espelharem aquilo que acham que é o espírito popular ou se é puro calculismo político.

Há vários exemplos que importa recordar:

-No ano passado tivemos António Costa a tecer elogios a Fernando Gomes pelo facto de Portugal ser o anfitrião da final da Champions League. Chegou a dizer que tal acontecimento seria "um prémio para os profissionais de saúde", após estes terem feito das tripas coração para dar resposta às necessidades crescentes dos infetados com Covid-19;

-Sem surpresa, esta mesma final da Champions League trouxe ao Porto milhares de ingleses fanáticos absolutamente indiferentes às preocupações de saúde pública. Nessa altura choveram críticas, sim, mas só porque os clubes eram estrangeiros...  Perante o previsível aumento de casos a UEFA apressou-se ainda a dizer que era impossível poderia provar a relação entre os dois acontecimentos;

-Antes disso tivemos ainda a majestosa festa do título do Sporting, que fez esquecer a Covid um pouco por todo o país. Sendo mais do que esperada a mobilização em massa dos adeptos, destacou-se a inação e a falta de planeamento das entidades responsáveis;

Chegados a este ponto, eis que surge a cereja no topo do bolo: Ferro Rodrigues apela à deslocação "em massa" dos portugueses para Sevilha para apoiar a seleção. A palermice foi de tal ordem que, no fim, nem ele próprio se atreveu a ir.

Perante tudo isto parece correto afirmar que o futebol é a "soma" que faz deste país um Admirável Mundo Novo  ilusoriamente livre de covid-19. É no minímo bizarro pensar a indignação que é manifestada com, por exemplo, a corrupção, e depois ninguém se espantar com o apoio político a ligas, clubes e afins.

Enquanto duram as competições presenciamos uma espécie de diplomacia futebolística, na qual seria de mau tom não comentar a última derrota dos "nossos heróis".

Está ainda para nascer o dia em que veja um político assumir-se neutro neste (meio) campo...

 

Eduardo Lourenço e o transcendente

É de certa forma macabro mas o poder da morte dos grandes é muitas vezes o de relembrar o quanto somos pequenos.

Sinto sempre isso de cada vez que assisto a uma retrospetiva obituária de grandes feitos. É verdade que aprendo sempre imenso mas ao mesmo tempo fico com a sensação de que nunca lá chegarei. Não em anos - que isso não sei - mas em alcances.

Após ver a entrevista de Fátima Campos Ferreira a Eduardo Lourenço senti-me criança outra vez. Não há como não gostar. À parte das perguntas - que por vezes achei desnecessárias - a clareza das respostas era de facto esplêndida. A forma esclarecida e profundamente conhecedora como o ensaísta descrevia o mundo era qualquer coisa de transcendental. Desarma-nos completamente.

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Passado, presente e futuro reúnem-se no discurso, sem nunca se confundirem, mas apenas para se complementarem. A riqueza de pensamento contrasta profundamente com a clareza e despretensão das suas palavras. É fantástico porque é algo extremamente raro! Poucos conseguem fazer prova de saber sem complicar o discurso. Só quem domina o conhecimento consegue simplificá-lo de forma a parecer "descomplexo". É por isso que Eduardo Lourenço é fascinante. Tudo parece simples sem o ser em momento algum.

"Sempre tive uma grande inaptidão para a realidade, para o real. Sou um pouco cego."

Eduardo Lourenço

Isto levar-me a pensar se no futuro vamos ter intelectos deste nível. Temos conhecimento, sim. Tecnologia, sem dúvida. Mas haverá sabedoria no sentido clássico do termo? Num tempo que se vive cada vez mais acelerado poderá prevalecer esta capacidade de distanciamento? De análise profunda? De apreciação? Haverá tempo para contemplar quando a leitura linear é cada vez mais difícil?

A verdade é que a importância histórica dos pensadores parece ser inversamente proporcional ao avanço do tempo. 

Não me parece possível sequer alcançar aqueles que estão gravados na memória coletiva analógica. O misticismo já não se forma no efémero mundo digital...

Adeus Eduardo Lourenço

Discuti com um perfil falso

Já não é novidade o facto de que o único partido de extrema-direita com representação parlamentar em Portugal se serve de perfis falsos para espalhar desinformação. A técnica não é nova e é comum a outros populistas que, não conseguindo crescer honestamente de acordo com as suas ambições, falsificam popularidade, servindo-se das redes sociais para fingir números e fomentar discórdia. É uma técnica eficaz e barata de conseguir contaminar a opinião pública, usando os tentáculos do extremismo para injetar indignação.

Não o planeava mas tive, recentemente, um contacto direto com um destes perfis falsos.

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A história remonta há cerca de uma semana atrás, quando o jornal Público anunciou que iria alterar a sua política de comentários no site. O diário explicava que iria passar a implementar "um limite diário de dois comentários submetidos por leitores não-assinantes" e "um limite diário de três acções de moderação (rejeição e aprovação de comentários) aos moderadores não-assinantes". Isto porque o Público tinha já implementado um sistema de moderação de comentários baseado na comunidade, que se revelou insuficiente. Neste sistema os utilizadores eram classificados de acordo com o número e qualidade de interações efetuadas no site, sendo distribuídos em níveis que lhes concediam - nos patamares mais altos - a possibilidade de moderar comentários de outrem.

Apesar do contributo positivo da maioria dos nossos leitores, o modelo de automoderação da comunidade deixou de garantir por si só a qualidade dos comentários publicados e tornou-se fonte diária de conflito, degradando a experiência de leitura do PÚBLICO e obrigando à intervenção permanente da redacção.

Público

 

Pessoalmente compreendo e aceito a mudança, razão pela qual tive a (comprovadamente infeliz) ideia de expressar a minha opinião na caixa de comentários do Facebook desta notícia. Fi-lo pois verifiquei a estupidez generalizada de pessoas que compararam esta ação a um ato de censura, fazendo absurdas alusões à Coreia do Norte, ao "lápis azul", ao Estado Novo, etc. Não consegui conter-me e comentei apenas que:

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Sei que hoje é impossível concordar com o que quer que seja sem se ser apelidado de ingénuo ou burro, mas mesmo assim insisti. Estava pronta para lidar com os céticos de profissão que se acham donos das certezas.

Não tardou a que recebesse respostas a indicar a mesmíssima bazófia já descrita anteriormente, demonstrando que estes "comentadores" não fazem ideia do que é a Coreia do Norte nem a censura. 

Já me tinha decidido a ignorar a ignorância quando um tal de "Miguel Alves" decide também implicar com as minhas opiniões. Achei então que talvez valesse a pena perder tempo, e escrutinar porque motivo a limitação de comentários era para ele algo tão alarmante:

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Escusado será dizer que as respostas que obtive foram nada mais que vazias:

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Porque motivo perdi o meu tempo e esforço a relatar esta lamentável tentativa de elucidação? Pelo motivo que se segue:

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As minhas suspeitas confirmaram-se. "Miguel Alves" tinha uma imagem genérica retirada de um filme como foto de perfil e outra igualmente impessoal na capa. Não tinha qualquer tipo de registo de atividade ou partilha. Nos interesses existiam apenas gostos em páginas de jornais, na página da Direção-Geral de Saúde e, sim, no perfil do Chega. 

"Miguel" era um perfil falso e sei-o pois, se forem hoje mesmo ao seu perfil (aqui), vão verificar que o mesmo não existe, que foi apagado após a minha denúncia, e que agora, naquela caixa de comentários (que podem ver aqui) surjo apenas eu, a falar para alguém que não existe, pois tudo foi eliminado.

Independentemente da relevância da notícia em causa ou sequer do tema acredito na importância da partilha desta história. No meu caso bastou fazer a pesquisa da sua imagem de perfil no Google Images para confirmar imediatamente que se tratava de um excerto de um filme. Além disso a falta de atividade e as páginas de que gosta são um sinal claro: neste caso só interagia com orgãos de comunicação social, com a DGES, e com o partido Chega.Não foi, por isso, difícil perceber que era um perfil falso, mas há casos em que pode tornar-se mais complexa essa identificação.

Não podemos deixar que façam de nós parvos.Estar atento e informado é melhor arma contra os extremismos. :)

 

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Sobre mim

Sofia Craveiro. Jornalista por obra do acaso. Leitora e cronista nas horas vagas.

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