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IN.SO.LEN.TE

Pode a estupidez ser censurada?

Mais um dia de quarentena, mais uma manhã de notícias frescas e absurdas.

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Cartoon: Vasco Gargalo

 

Hoje ao acordar e após dar uma olhada pelas últimas novidades no mundo, vejo mais uma grande demonstração de estupidez por parte do Presidente dos Estados Unidos da América. Após um estudo confirmar que substâncias desinfetantes como cloro e o álcool eliminam o novo coronavírus da saliva e gotículas, Donald Trump sugeriu que talvez fosse possível testar uma forma de injetar estes produtos em seres humanos. Referiu também a possibilidade de investigar se poderia ser colocada luz UV dentro do corpo para combater o vírus, pois - segundo os dados apresentados na conferência de imprensa estatal - as radições UV enfraquecem o vírus. Parece inventado mas não é (podem confirmar aqui).

As reacções a estas declarações multiplicaram-se como cogumelos, com inúmeros especialistas e entidades a alertar para o facto de que estas práticas podem ser fatais. Perante a indignação generalizada, Robert Reich, ex-secretário do Trabalho do presidente Bill Clinton, apelou no Twitter para um "bicote à propaganda".

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Percebo a intenção, mas isto levanta questões que não são fáceis de responder: devem os jornalistas abster-se de noticiar este tipo de declarações estatais, por saberem que colocam em causa as recomendações relativas à saúde? Podem eles negar-se a estar presentes nestas conferências de imprensa, e recusar-se a divulgar ao público tamanho absurdo? A resposta imediata pode parecer sim, mas de facto a liberdade de expressão é uma coisa complicada.

Falei então com um antigo professor sobre esta questão existencial, de forma a perceber bem qual a posição de alguém mais experiente. Este professor, chamado Walter Dean, além de ter sido jornalista na imprensa local e nacional americana durante largos anos, é hoje investigador de temáticas relacionadas com jornalismo, já formou inúmeros profissionais de renome e integra consórcios do ramo. Além de tudo isto é um cidadão americano informado e consciente.

Perguntei-lhe o que ele acha acerca de um eventual boicote às conferências de imprensa de Trump por parte dos jornalistas e ele respondeu-me que isso não é algo que se recomende, pois as pessoas devem ter informação acerca do que ele transmite, mesmo que não seja verdade. Apesar disso, e em alternativa, é possível evitar transmitir as declarações dele em direto, e apenas veicular a informação após ser tratada. Parece-me uma boa solução, pois este método já permite incluir informação de especialistas, e contrapô-la à especulação estapafúrdia do presidente. 

Readers don't need protection. They need verified information.

...disse Walter Dean, e é absolutamente verdade. Se um jornalista decide não noticiar algo que considera errado está já a tecer um juízo prévio, impedindo os seus leitores de o fazer por eles próprios. Por isso é tão importante que todos os cidadãos tenham espírito crítico.

...And the reason readers don't need protection is that they must make decisions about their government, community and, in this case, their own safety. One does not serve decision makers by withholding information that may be scary or unpleasant.

Essa é a base da liberdade de informação, de expressão e da democracia e não pode ser posta em causa. O que me inquieta é que a liberdade acarreta responsabilidade, e infelizmente acho que muita gente não pensa desta forma atualmente. Há muita desinformação e muitas pessoas a acreditar nas balelas destes líderes que nada sabem. É isto que enfraquece a democracia: a incapacidade dos cidadãos de analisarem a informação e de tomar decisões com base em evidências. 

Em última instância, a falta de responsabilidade cívica (que resulta de uma escolha individual) inviabiliza a política democrática. A liberdade só existe se todos a defendermos, caso contrário seremos vítimas da nossa própria falta de visão e limitação de pensamento (ou, numa palavra, da ignorância).

Como solucionar isto e respeitar o livre-arbítrio?... aceito sugestões nos comentários :)

 

 

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Sobre mim

Sofia Craveiro. Jornalista por obra do acaso. Leitora e cronista nas horas vagas.

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