Como promover um comprimido
Podem chamar-lhe teoria da conspiração, podem chamar-lhe cepticismo, mas pessoalmente tenho muitas dúvidas que Bolsonaro tenha de facto testado positivo para a Covid-19. Eu e muitos, aliás (como é possível verificar nesta peça do DN).
Se o presidente brasileiro proclamou aos sete ventos que está contaminado, é porque tem um forte interesse que o leva a fazê-lo e nada leva a crer que seja o bem-estar do seu povo. Rui Tavares descreve explica isto na perfeição, na sua crónica no Jornal Público:
Uma das coisas mais impressionantes na reação pública ao anúncio de que Jair Bolsonaro testou positivo ao vírus da covid-19 foi tanta gente não acreditar ser verdade, e por uma excelente razão: é que foi o próprio Presidente do Brasil a fazer o anúncio público de que estava infetado — o mesmo Presidente do Brasil que ainda há três meses se recusou a mostrar o teste ao mesmo coronavírus cujo resultado teria então dado negativo.
A postura negacionista que Bolsonaro manteve desde o início da pandemia - apelidando de "gripezinha" a doença contagiosa que já matou milhares no seu país - torna (no minímo) suspeita esta aparente predisposição para assumir o contágio. É impossível aceitar as suas palavras como factos, e tudo leva a crer que o anúncio de contaminação terá outros interesses que o justifiquem. A promoção da hidroxicloroquina será apenas uma das hipóteses.
Screenshot do vídeo publicado por Jair Bolsonaro nas redes sociais, onde surge a tomar hidroxicloroquina
Ao assumir publicamente que foi infetado com covid-19, Bolsonaro consegue, não apenas patrocinar a sua tão adorada hidroxicloroquina (através de um vídeo obscenamente promocional, publicado pelo próprio nas suas redes sociais), como irá depois utilizar o seu testemunho para descredibilizar os efeitos da doença. Irá sempre tentar sair vitorioso e impune desta luta populista para mostrar que estamos todos a exagerar. Bolsonaro irá utilizar o facto de que foi contagiado para minimizar os efeitos da doença, sacudindo dos ombros a culpa pela irresponsabilidade governativa que (literalmente) enterrou grande parte do país.
Felipe Santa Cruz, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil
Mas não fica por aqui.
Na hipótese de o presidente estar de facto infetado, o quadro é ainda mais preocupante, em especial porque será impossível rastrear todos os contactos que já efetuou (basta pensar nas várias manifestações em que participou, nos diversos políticos com quem contactou, e na sua calorosa abordagem aos apoiantes, sempre sem máscara). Neste cenário o próprio Presidente assume um papel de grande impacto na disseminação do vírus, contribuindo para o agravar da situação pandémica num país cada vez mais ameaçado pela fome.
Apesar disso nada atrapalha Bolsonaro, que não se coibe de afirmar que “nenhum país do mundo fez como o Brasil", pois ali foi possível preservar "vidas e empregos sem espalhar pânico, o que também leva à depressão e à morte”.
Haverá comprimidos que curem esta falta de noção?